Entrevista com a Psicóloga Adriana Bugalho sobre Como Enfrentar Dificuldades Conjugais

Olá, mamacita! Hoje, a psicóloga Adriana Bugalho, especialista em intervenção sistémica individual e com casais, vai abordar um tema delicado, mas extremamente importante: os casamentos infelizes. Vamos explorar as causas, os sinais e as possíveis soluções para enfrentar as dificuldades conjugais de maneira saudável e construtiva.

Olá, Adriana! Ficamos felizes de a ter connosco. Para começar, quais são os sinais mais subtis de que um casamento pode estar a enfrentar problemas que ainda não foram reconhecidos?

Adriana Bugalho- Um sinal subtil está relacionado com a presença da crítica. Quando a crítica começa a “sentar-se” demasiado à mesa. Quando assistimos a um criticismo que se torna permanente, temos um dos sinais de que algo não está a funcionar. Paralelamente, o desinteresse sobre coisas que antes eram importantes, o chamado “tanto me faz”, “é como quiseres”, que pode ser revelador de desinvestimento e de desconexão.

Na sua experiência, quais são os fatores menos óbvios que podem contribuir para a infelicidade conjugal?

A.B.- Não sei se são os menos óbvios, mas diria que o padrão de vinculação de cada pessoa e as experiências relacionais observadas na família de origem, podem ter um grande impacto na satisfação conjugal… porque se traduzem em formas de pensar, em comportamentos específicos que muitas das vezes entram em conflito com o do outro. Se uma pessoa tem uma vinculação mais ansiosa, procura muita proximidade, e outra tem uma vinculação mais segura, procura mais momentos de autonomia, de “separação”, então podemos ter um problema se isto não for percebido e gerido de forma adequada.

Como as pressões sociais e culturais podem influenciar negativamente a dinâmica de um casamento, e de que maneira os casais podem proteger-se contra essas influências?

A.B.- Definindo claramente quais são os limites que estabelecem à volta da relação, decidindo que tipo de informação deixam que “passe para dentro”. Tendo claro, também, quais são os valores, os objetivos de cada um e do casal, dessa entidade que construíram juntos, e que não deve ser posta em causa pelo ruído que vem do exterior. Quão seguros estamos daquilo que queremos para nós?

A falta de comunicação é frequentemente citada como um problema em casamentos. Pode partilhar exemplos concretos de como a comunicação inadequada se manifesta e como pode ser melhorada?

A.B.- Um exemplo claro de comunicação que não funciona é tentar fazer pedidos através de uma crítica, ao invés de manifestar uma necessidade. Alguém que se sente atacado, não vai responder da forma que a outra pessoa desejaria. A crítica traduz muitas vezes alguma inflexibilidade e sabemos que a resposta para a inflexibilidade é normalmente mais inflexibilidade.

Porque é que eu digo que critica soa a ataque? Primeiro porque a frase tem normalmente um “tu” e um “não/nunca”, depois porque muitas vezes não se centra num comportamento específico (ex. não levar o lixo) mas sim numa característica de personalidade mais estável (ex. és a pessoa mais preguiçosa e sem iniciativa que já vi”). E uma coisa é pôr em causa um comportamento, outra é pôr em causa a pessoa.

Podemos melhorar a comunicação expressando mais o que precisamos, do ponto de vista das nossas necessidades “eu preciso disto porque…”, “sinto que… pelo que podes assegurar…?”; circunscrevendo a nossa comunicação àquele momento, ao que nos incomoda naquele comportamento, e mostrando o que esperaríamos que acontecesse.

Existe uma receita para manter a chama acesa num casamento de longa duração, especialmente em meio às exigências da vida moderna?

A.B.- Cada casal tem as suas necessidades, os seus rituais, os seus significados e por isso é impossível que a mesma “receita” sirva a todos. Mas sabemos que há “ingredientes” fundamentais, relacionados com a compreensão e validação da pessoa parceira, promovendo sentimentos de aceitação, admiração e de valorização; a capacidade de expressar emoções, promovendo uma relação baseada na segurança; a capacidade de responder a problemas em conjunto; e claro… uma vida sexual satisfatória, que tem na base o erotismo, e não apenas o sexo. Qualquer pessoa pode fazer sexo e não sentir nada. Aquilo que faz a diferença é o erotismo na relação…a capacidade de imaginar, a curiosidade, a novidade, o mistério que cada um traz e que partilha com o outro.

A individualidade é crucial em qualquer relacionamento. Como é que os casais podem equilibrar a individualidade com a intimidade para garantir um relacionamento saudável?

A.B.- Sem dúvida, mas creio que por vezes existe um mal-entendido quando se fala de individualidade e intimidade, que parte do pressuposto que quanto maior espaço para a individualidade, menor espaço para a intimidade, e não é necessariamente assim.

A individualidade, ou seja, a possibilidade de ter um espaço que me é reservado, onde posso estar a sós comigo, também com outras pessoas, em momentos de lazer, de prazer, de aprendizagem… pode fortalecer bastante a intimidade, porque viver além do parceiro, mostra ao parceiro um “alguém novo” (ou diferente) muitas mais vezes. E conseguir reconhecer novidade, conseguir ver o parceiro noutros papéis, com novas habilidades, etc., pode alimentar bastante a “chama” da admiração e do erotismo. O equilíbrio tem de ser definido por cada casal: quem tem mais necessidade de proximidade? Quem tem mais necessidade de separação? Como é que nos ajustamos, o que flexibilizamos para que ambos nos possamos sentir satisfeitos tanto quanto possível? Não há “o segredo”, é preciso comunicar sobre.

Quando as dificuldades conjugais se tornam aparentes, quais são os primeiros passos que os casais devem tomar antes de considerar uma separação?

A.B.- Conversar sobre o que incomoda, sobre o que cada um espera do outro, sobre o que os manteve até ali, sobre o que precisam naquela fase da relação. A vida desenrola-se, as pessoas mudam e a relação (e cada um nessa relação) precisa ajustar-se… só que muitas vezes um quer que seja o outro a ajustar-se completamente, sem ter de responsabilizar-se por nada. É aí que normalmente começam os problemas. Mas quando há amor, vontade de estar juntos, de fazer a relação funcionar, procurar terapia para corrigir os padrões disfuncionais é uma boa aposta. Eu digo em tom de brincadeira, mas muito a sério na verdade: procura terapia antes de abrirem um fosso entre vocês. Quando o casal já vem com muita crítica, desprezo, tensão muito elevada, afastamento emocional, é muito difícil recomeçar. Então, venham antes! Quando ainda sentem que têm forças para fazer mudanças.

Conversar sobre problemas conjugais com amigos ou familiares pode ser um terreno delicado. Como é que os casais podem encontrar um equilíbrio entre desabafar e manter a privacidade do relacionamento?

A.B.- Em primeiro lugar, gostaria de dizer que considero absolutamente fundamental a existência de redes de suporte como os amigos e igualmente relevante a disponibilidade que precisamos de ter, ao longo da vida, para não deixar de investir nelas. Quando vejo pessoas sem rede de suporte, vejo sempre isolamento. Quando a relação de casal está mal por qualquer motivo, esse isolamento é gritante… porque se traduz num sentimento de vazio, de “não tenho mais ninguém”. Muitas pessoas não se dão conta disto, de que estão numa relação que as isola, aos poucos, dos outros. E este é um sinal de perigo, uma “red flag” se quisermos.

Relativamente ao equilíbrio, diria que há zonas que só pertencem ao casal e precisa ser o casal a defini-las. Diria que nem é tanto sobre o que se partilha “da relação”, mas do “outro que está em relação”. Um exemplo, talvez não seja relevante partilhar com um amigo que a minha namorada fez uma mamoplastia (porque é um assunto dela, do seu corpo), mas pode ser importante partilhar como me sinto quando discutimos, que tópicos são mais frequentes, o que me incomoda, etc.

Após uma traição, a reconstrução da confiança é um desafio enorme. Quais estratégias recomenda para os casais que desejam tentar essa reconstrução?

A.B.- A melhor estratégia é fazer terapia de casal. A terapia de casal vai ajudar ambas as pessoas a lidar com o que sentem em relação à traição; a perceber as consequências de determinadas perguntas (que por vezes as pessoas fazem e só desgastam e criam fantasmas desnecessários na relação); a perceber a motivação individual, as necessidades, o que sentiu, o que procurava a pessoa que traiu (no fundo, olhar para o que existe além daquele momento específico de traição); estabelecer compromissos, a reconstruir essa confiança que fica sempre bastante abalada.

A intimidade emocional e física desempenha um papel fundamental na satisfação conjugal. Quais são os sinais de que essa intimidade está comprometida, e como é que os casais podem trabalhar para restaurá-la?

A.B.- A intimidade fica comprometida quando não há tempo para olhar o outro, para querer demorar numa conversa, num momento a dois. Quando tudo é mais importante, mais urgente do que olhar o parceiro, então a intimidade está mesmo comprometida. Porque olhar o parceiro é saber sobre ele e há casais que vivem juntos e aquilo que sabem do outro reporta ao início da relação, ao momento antes de terem filhos. Essa restauração tem que ser feita com responsividade, com envolvimento… cada pessoa tem que envolver-se ativamente na manutenção da relação, criando momentos de partilha, de apreciação, de descontração, de lazer, de prazer. Momentos em que seja possível, simultaneamente, aceder ao mundo do outro e ao mundo que criaram em conjunto, ao olhar na mesma direção. Relativamente à intimidade física, responsabilizar-se trazer o erotismo para a relação, como falámos anteriormente.

Na sua opinião, quais são as práticas diárias mais eficazes que os casais podem adotar para fortalecer a sua conexão emocional e prevenir a infelicidade no casamento?

A.B.- Diria que a prática diária mais útil é conversar e interessar-se, verdadeiramente, pelo mundo do outro. Querer estar próximo, reservar todos os dias um tempo para estarem a sós, a partilhar alguma coisa, a sentirem-se presentes. Criar (e manter!) uma cultura de apreciação: valorizando aquilo que o outro faz; mostrando apreço, cuidado, carinho; elogiando, fazendo o outro sentir que é desejado e admirado. Todos precisamos sentir que pertencemos, que somos vistos, apreciados… e esse é um elemento fundamental para a satisfação em qualquer relação.

Muito obrigada, Adriana, por partilhar as suas perspetivas connosco. Esperamos que esta entrevista ajude muitas leitoras a refletir sobre as suas relações e a encontrar caminhos para a felicidade. ❤️

imagem adriana bugalho retrato entrevista revista mamacita

Sobre a Adriana Bugalho

Adriana Bugalho é psicóloga, especialista em intervenção sistémica individual e com casais. Segue-a no Instagram para mais insights e dicas sobre como melhorar a qualidade das tuas relações.

Até à próxima! Cuida bem das tuas relações e lembra-te que a felicidade conjugal é um caminho contínuo de crescimento e compreensão. 💖

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